Esclarecendo 5 mitos da cama compartilhada

Quem é mãe e pai já deve ter ouvido muitos comentários e palpites sobre a cama compartilhada, nesse texto venho desconstruir alguns eles.

1- “A criança vai ficar insegura”

É mentira que sua criança vai ficar insegura. O desenvolvimento infantil é mediado por múltiplos fatores, não apenas pela forma como vocês dormem. A sensação de segurança de seus filhos e filhas é resultado da forma como você e eles interagem entre si e com o ambiente. A criança que se sente acolhida e respaldada nas suas necessidades, emoções e medos, será uma criança mais segura em relação ao mundo exterior, uma vez que conta com um porto seguro no seu lar. A regulação de estresse e o controle da ansiedade oferecida aos bebês através da amamentação, o contato físico e a conexão emocional que a cama compartilhada inegavelmente facilita, ajuda a reduzir a resposta do organismo do bebê ao cortisol, tendo efeitos no desenvolvimento neurológico no longo prazo.

Um estudo recente (2022) concluiu, com uma pequena amostra de 215 crianças, que uma duração da cama compartilhada superior a 6 meses poderia ser apontada como fator de proteção associado a menor ansiedade, menos hábitos de sucção não nutritiva (chupeta ou dedo), maior incidência de amamentação e em consequência, também menor incidência de más oclusões . (Carrillo-Diaz et al. 2022)

2- “O casal terá sua vida sexual prejudicada “

A vida sexual do casal muda apenas pelo fato de terem virado pais, mesmo que o bebê durma em outro quarto. O relacionamento do casal não pode se limitar ao sexo, uma bela conversa com uma bom café, esforço conjunto na arrumação da casa, no cuidado dos filhos, compartilhar os momentos de lazer em família, são formas do casal se aproximar e fortalecer o amor, além do simples ato sexual. Por outro lado, o sexo não precisa ser única e exclusivamente na cama do casal. Com o bebê dormido no quarto do casal, em segurança, todos os outros cômodos da casa estão disponíveis para o casal aproveitar, basta usar a imaginação para apimentar relação, e sair da mesmice da cama no quarto.

Vale deixar o alerta : NUNCA tenha relação sexual no mesmo cômodo da criança, mesmo que ela seja um bebê muito pequeno. Toda a agitação e estresse do momento é interpretado pelo cérebro infantil como um momento de altíssima violência que pode deixar marcas no seu desenvolvimento.

3- “É só colocar o bebê na cama de casal “

Não é só trazer par cama do casal! Quando o casal passa ser uma família com filhos e deseja fazer cama compartilhada, a cama de casal precisa virar uma cama familiar, anexando à cama de casal um espaço adequado para o terceiro membro, o bebê. Mesmo pequenininho o bebê ocupa o espaço de uma pessoa adulta, ele abre os braços, se movimenta, precisa de espaço para respirar (sem ter seu ar poluído pelos resíduos respiratórios do outro), da mesma forma que mãe e pai precisam ter o seu espaço na cama para que o descanso seja adequado. Um arranjo de cama compartilhada inadequado pode prejudicar o sono do bebê e dos adultos, podendo incluso colocar em risco a sua segurança.

A pessoa que participa ativamente dos cuidados do bebê é a mais apta para compartilhar a cama com ele, uma vez que seu cérebro experimentará mudanças no padrão de sono, apresentando um estado de hiper atenção no sono noturno, e um sono fracionado, em padrão similar ao do bebê, uma forma da natureza garantir que as crianças se mantenham seguras durante o sono.

Ao fazer cama compartilhada se atente a seguir algumas regras de segurança básicas:

  • O bebê deve dormir preferencialmente do lado do seu principal cuidador (geralmente será a mãe). Contra a parede ou com grade de proteção lateral. Cuidadores eventuais não possuem as modificações fisiológicas necessárias para garantir a segurança do bebê.
  • Cobertas pesadas, fitas nas roupas de cama ou roupas de dormir devem ser evitadas, pelo risco do bebê se enrolar nelas.
  • Uso de drogas, álcool ou medicamentos que alteram a consciência ou geram sonolência contraindicam a cama compartilhada pelo risco de sono pesado e redução do estado de atenção durante o sono do adulto.
  • NUNCA deixe o bebê sozinho da cama, as quedas da cama são frequentes e acontecem em qualquer idade, mesmo que o bebê não consiga nem rolar, não o deixe sozinho.
  • A cama familiar deve se adaptar às necessidades do bebê conforme cresce, descer as grades ou mesmo levar o anexo destinado ao bebê ao nível do chão para evitar quedas.

4-“A criança nunca vai aprender a dormir sozinha no seu quarto “

É mentira! Os palpiteiros de plantão adoram ser fatalistas e meter medo nas famílias para impor condutas. Mas não há pena que dure cem anos, nem corpo que resista. Então, na medida que as crianças crescem e cobram seu espaço, e que sentimos a necessidade de recobrar nosso espaço pessoal novamente, a cama compartilhada vai chegar ao fim.

A duração da cama compartilhada não depende apenas das crianças, o desejo dos pais também é determinante nesse processo. Se você gosta e quer ficar mais um pouquinho na cama compartilhada, sua criança concorda e todo mundo dorme bem, não há problema manter. A recomendação atual é que os bebês compartilhem o quarto com seus pais pelo menos até 6 meses, idealmente até um ano. Tempo no qual a proximidade com os pais permitirá o acolhimento rápido, favorecendo o amadurecimento do sistema de regulação do sono noturno.

A condução do fim da cama compartilhada pode ser feita quando alguma das partes está incomodada, trazendo a comunicação como base do processo de reconhecimento de limites pessoais, apropriação dos espaços e ganho de segurança.

5- “A criança não vai conseguir dormir com ninguém além dos pais “

Mais um mito que tenta colocar nos pais a responsabilidade pelo relacionamento que os outros adultos mantem com a criança. Se uma criança não dorme com você não é que ela não saiba dormir, mas que ainda não construiu uma relação de confiança firme o suficiente para conseguir relaxar e se entregar ao sono em seus braços. Da mesma forma que aprendem ir brincar com coleguinhas, ir para escola, ou passar a tarde com a vovó, as crianças aprendem a dormir fora de casa, ir na festa de pijama do coleguinha, ou passar a noite na vovó, na hora certa para tal.

A segurança que permite a criança dormir sem os pais se constrói, não depende apenas do local onde dorme, mas da rede de relacionamentos que tem à sua volta. Se você convida uma criança a dormir na sua casa sem os pais e ela não quer, o problema não está em a criança ser apegada aos pais, isso é natural. A dificuldade está na relação que você construiu com a criança, que não lhe oferece a segurança suficiente para confiar e se permitir partir e dormir com você.

A criança que sabe que tem o acolhimento e confiança de seus pais e outros adultos à sua volta, é uma criança mais segura e capaz de desenvolver autonomia em vários sentidos, incluso ao dormir. Independente se um dia fez cama compartilhada com seus pais ou não.

Referências

Carrillo-Díaz M, Ortega-Martínez AR, Ruiz-Guillén A, Romero-Maroto M, González-Olmo MJ. The impact of co-sleeping less than 6 months on children’s anxiety, oral habits, and malocclusion in a Spanish sample between 2 and 5 years old: a cross-sectional study. Eur J Orthod. 2022 Jan 25;44(1):110-115. doi: 10.1093/ejo/cjab032. PMID: 34089051.

Moon RY, Carlin RF, Hand I; AAP Task Force on Sudden Infant Death Syndrome; AAP Committee on Fetus and Newborn. Sleep-Related Infant Deaths: Updated 2022. Recommendations for Reducing Infant Deaths in the Sleep Environment. Pediatrics. 2022;150(1):e2022057990. DOI: https://doi.org/10.1542/peds.2022-057990

Moon RY, Carlin RF, Hand I; AAP Task Force on Sudden nfant Death Syndrome; AAP Committee on Fetus and Newborn. Sleep-Related Infant Deaths: Updated 2022 Recommendations for Reducing Infant Deaths in the Sleep Environment. Pediatrics. 2022;150(1):e2022057990

Precisando ajuda?

A consultoria Mães com Ciência pode ajudar na amamentação, sono, volta ao trabalho, desmame gentil e educação positiva, entre outros.  Saiba como funciona aqui ou  Agende uma consulta virtual aqui.

*Texto de Zioneth Garcia.

Veja mais textos sobre o sono infantil aqui

Publicidade

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s