Problemas de saúde que podem atrapalhar o sono das crianças

Saúde, bem estar e sono estão intimamente relacionados. Não podemos esquecer que cada organismo é um sistema, onde anatomia, fisiologia e psique interagem entre si. Uma dificuldade em qualquer um desses componentes vai resultar em um desequilíbrio que pode comprometer o bem estar, se manifestando entre outras, nas dificuldade com o sono.

Uma das primeiras fases da rotina diagnóstica das dificuldades com o sono das crianças é identificar e tratar possíveis condições clínicas que possam estar prejudicando o seu bem estar, já que isto pode causar níveis maiores de estresse ao longo do dia. Lembre: estresse é o inimigo número um do sono saudável, para crianças e adultos.

Às vezes são coisas simples, que com uma pequena intervenção e orientação do profissional se solucionam, outras são causas mais complexas, que requerem uma pesquisa mais profunda por parte de especialistas, podendo levar mais tempo. Iniciar o processo de correção da higiene do sono e hábitos comportamentais, enquanto se tratam as situações clínicas, garante uma melhora mais eficiente e duradoura do descanso familiar.

Problemas de saúde da criança que podem alterar o sono infantil

Problemas respiratórios e otorrinos: broncoespasmo, resfriados, catarro constante, tosse constante, pneumonia, infecções de ouvido, inflamação do canal auditivo recorrente ou pontual, adenoides inflamadas, inflamação recorrente de garganta (pode ter relação com refluxo oculto). Eles podem atrapalhar porque podem causar apneia durante o sono, em especial quando a criança deita completamente horizontal, apenas por efeito mecânico da obstrução em vias respiratórias, causada pela secreção, por exemplo. É comum nesses casos presenciar um despertar agitado, às vezes com choro, precisando uma intervenção mais ativa para acalmar a criança.

Especialmente em crianças pequenas, o catarro que bloqueia vias respiratórias, pode atrapalhar alimentação e aleitamento diurno, e em consequência virem mais despertares noturnos (para compensação nutricional). Por outro lado, as mudanças abruptas na rotina (deixar de ir na escolinha ou não realizar as atividades regulares p.e), ter dificuldades para se alimentar, sentir se mais carente pelo desconforto geral (procurando mais sucção do normal ), entre outras; acabam elevando os níveis fisiológicos de estresse que a criança enfrenta, precisando um esforço ainda maior dos pais ou cuidadores para lhe ajudar relaxar para adormecer.

Os roncos dos pequenos podem parecer fofinhos, mas são sinal de alguma obstrução e precisam de atenção, já que essa perturbação do ciclo de sono prejudica a qualidade do descanso, deixando as crianças mais irritadas ao longo do dia, e em longo prazo, sem correção, pode alterar a saúde do sistema imunológico e processos de aprendizagem. Se seu filho sempre roncou, procure a avaliação de otorrinolaringologia.

Se existe alguma condição que comprometa a saturação de oxigênio, pode haver um ajuste no ritmo respiratório (respirando com ritmo mais agitado do normal), podendo levar ao esgotamento físico da criança rapidamente, sendo necessário ajustar a rotina de descanso durante as crises, talvez incluir uma soneca, garantir sonecas mais longas ou antecipar a hora de dormir. Casos de otites repetitivas e constante inflamação da garganta, devem ser avaliados também desde a ótica do gastropediatra, eles podem ser sinal de refluxo oculto.

Problemas gastrointestinais: refluxo, refluxo oculto, gases e cólicas, também podem causar bastante desconforto durante o sono, especialmente na postura completamente horizontal. Nos primeiros meses de vida o refluxo é fisiológico, é normal, o que não significa que não cause desconforto. Lembra da famosa azia? bebês e crianças pequenas com refluxo podem experimentar essa sensação constantemente. Quando ainda são lactantes, é comum que façam mais sucção não nutricional que o normal, já que a sucção atua como analgesia, e alivia a sensação de azia. Aquele bebê que não quer sair do seio, mas quando vem para o seio não parece sugar com vontade, aquele que simplesmente quer ficar com a chupeta na boca o tempo todo, ou que dorme muito bem na vertical, no ombro do papai, mas que no berço deitado acorda rapidamente. Parece é familiar?

Crianças com refluxo ou refluxo oculto, podem ter um despertar agitado, com choro, tendo dificuldade para adormecer novamente, e passando o dia muito mais irritados, tendo dificuldades à hora de comer (ou mamar), e precisando muita ajuda na hora de relaxar para adormecer. Muitas vezes o refluxo, refluxo oculto, as cólicas e os gases, são apenas sintomas de outra situação, além de tratar o desconforto, é muito importante pesquisar as razões pelas quais a criança apresenta esses sintomas. Situações como a hiperlactação, quando a mãe produz muito leite, ou a alergia alimentar, podem causar sintomas gastrointestinais, e nesse caso o tratamento deve ser para mãe e bebê.

Quando as crianças estão se adaptando a novas formas de alimentação (recém nascidos, alimentação complementar, introdução de laticínios), se recuperam de viroses ou passaram por tratamento com antibióticos, a microbiota intestinal irá ter mudanças, e podem acontecer episódios de indigestão, com gases ou cólicas, que também podem atrapalhar o descanso, até encontrar um novo equilíbrio. Por isso que hoje é comum receber probióticos após uso de antibióticos

Dica: Quando a criança apresenta alguma situação que pode lhe obstruir as vias respiratórias ou lhe causar azia, deitar com a cabeça mais elevada, semi sentada, para evitar que a secreção deslize pela laringe e faringe, ou os sucos gástricos subam pelo esófago, ajuda muito melhorar o seu descanso.

Alergias: respiratórias, alimentares (refluxo pode ser um sintoma), urticária, dermatites. Além do mal estar pelos sintomas respiratórios , gastrointestinais, e em pele. O mecanismo imunológico que leva à resposta alérgica está intimamente relacionado com o sistema modulador do sono (equilíbrio cortisol/melatonina). Está relação é bidirecional, os níveis elevados de histaminas, que caracterizam uma resposta alérgica estão associados à elevação dos níveis de cortisol, e em consequência dificuldade para adormecer, pelo bloqueio e atraso na ação da melatonina. Crianças em crises alérgicas podem manifestar dificuldades com o sono, tendo maior incidência de distúrbios sono (insônia, pesadelos, terror noturno, atraso das fases de sono), ao tempo que, crianças com dificuldades no sono, que experimentam níveis elevados de cortisol, podem ter um sistema imunológico mais suscetível às respostas alérgicas.

O manejo da alergia, de qualquer tipo, deve ser acompanhado pelo alergista, e ter um manejo integral, considerando o controle dos sintomas, higiene do sono, identificação dos alérgenos que detonam as crises, e manejo durante as crises.

Desenvolvimento neuropsicomotor: aquisição de habilidades motoras e cognitivas (saltos de desenvolvimento), picos de crescimento, transtorno do espectro autista, epilepsia, terror noturno, sonambulismo, atraso de desenvolvimento neuromotor, atraso de linguagem, distúrbio de percepção sensorial (hiposensível ou hipersensível), entre outros, são situações que podem levar a criança e a família experimentar altos níveis de estresse, e em consequência ter noites mais agitadas.

As famosas fases de desenvolvimento não são uma sentença de noites ruins, elas envolvem um maior nível de estresse: quer pegar com as mãos/ sentar/ engatinhar/ andar/ falar/ escrever e ainda não consegue. Identificar e estimular adequadamente oferecendo atividades que permitam treinar as habilidades motoras e cognitivas a cada fase de desenvolvimento é de grande ajuda. Acompanhar a aquisição dos marcos de desenvolvimento junto do profissional é muito importante. Se você percebe/ sente/ acha que algum marco de desenvolvimento de sua criança está em atraso, procure o profissional para fazer a avaliação. Em esse caso é melhor pecar por excesso do que por omissão, se não for nada, tudo bem, pelo menos terá uma orientação sobre como estimular adequadamente, e ficaram tranquilos. Mas se há alguma situação que precisa intervenção, você terá garantido uma intervenção mais oportuna. Nos primeiros anos, há maior neuro plasticidade, com o que a intervenção precoce garante melhores resultados de qualquer terapia.

Desconfortos normais da infância : dentição, viroses em geral, desconforto de vacinas, e fases de mudanças de rotina, também podem trazer dificuldades com o sono diurno e noturno, ao aumentar a irritação e estresse da criança ao longo do dia. Identificar e ajudar a criança relaxar nessas fases é o ideal.

Quando falamos de problemas clínicos que podem afetar o sono infantil, lembres-se que identificar, corrigir e manejar as fontes de estresse da criança em cada fase de seu desenvolvimento é a chave para ter um sono adequado. Integrando o tratamento clínico, com a higiene do sono e a correção de hábitos comportamentais prejudiciais, o descanso da família estará garantido em curto, médio e longo prazo.

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Texto original de Zioneth Garcia

Referências

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Nunes ML, Cavalcante V. Avaliação clínica e manejo da insônia em pacientes pediátricos. J Pediatr (Rio J). 2005;81: 277-86.

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