Muito leite pode ser um problema: entenda a hiperlactação

Seu filho engasga constantemente durante a mamada, fica nervoso e parece brigar com o peito? Seu peito vive sempre cheio e toda vez que seu filho solta o peito no meio da mamada você vê um grande jato de leite saindo? seu filho sempre parece insatisfeito mesmo quando vive mamando o tempo todo e o peito vive cheio de leite? Então você pode estar experimentando um excesso de produção de leite materno: hiperlactação.

Muito leite pode ser um problema

Às vezes uma mãe produz mais leite do que o bebê precisa, e isso pode tornar as mamadas estressantes e desconfortáveis para o bebê e a mãe. A maioria dos bebês de mães que têm leite em excesso ganham peso mais rápido que o normal. Isso não é um problema, a não ser que haja outras dificuldades por causa do excesso de leite. Porém, alguns bebês cuja mãe tem excesso de leite ou hiperlactação, não mamam o suficiente porque eles têm dificuldades em controlar o forte fluxo e não conseguem se alimentar com facilidade. Sendo difícil a chegada ao leite materno posterior durante as mamadas. Parece que o peito nunca chega ficar bem murcho ou “esvaziar” completamente.

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Quando a mãe tem hiperlactação, o bebê tem dificuldade para chegar no leite materno mais rico em gorduras, deixa de mamar rapidamente e por vezes irritado por se engasgar. Imagine que você está com muita sede e a única forma de beber é através de uma mangueira de alta pressão, com certeza matará sua sede, mas pode se engasgar, assustar e desistir no intento. Outro comportamento comum dos  bebês cujas mães têm leite em excesso é fazer mamadas curtas muito frequentes. Isto porque enchem a barriguinha apenas com um leite anterior que vem em grande volume e é mais rico em açúcares e água, deixando de consumir as outras fases do leite materno, seja por desistir da mamada ao engasgar ou por encher a barriguinha antes de conseguir que a glândula libere mais gorduras no leite.

Costumo explicar a hiperlactação com uma metáfora: Imagine que você está num dia corrido, sem tempo para tomar uma refeição completa, passa o dia comendo uma tortinha ali, um bolinho lá, talvez uma fruta e monte de balinhas, assim provavelmente ao chegar a noite estará irritada, e desejando fazer uma refeição completa, com arroz, feijão, etc. Para o bebê, consumir as três fases do leite materno é o equivalente à sua refeição completa, o seu prato de arroz, feijão e etc. É disso que ele precisa em toda mamada para se sentir satisfeito e descansar bem, se não consegue chegar ao leite posterior, seu bebê vai ficar irritado, de barriga cheia mas nutricionalmente insatisfeito.

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Quando uma mãe produz mais leite que o necessário pode observar alguns dos seguintes comportamentos no bebê:

* Bebê chora muito e geralmente é irritadiço ou inquieto

*Às vezes, o bebê pode sufocar, se asfixiar, cuspir ou tossir durante a mamada;

* O bebê parece querer morder ou pendurar-se no bico do peito durante a mamada;

* O leite jorra quando o bebê larga o peito, especialmente no começo da mamada;

* A mãe pode ter o bico do peito dolorido;

* O bebê pode se contorcer e às vezes gritar;

* A mamada parece uma batalha, o bebê pega e larga o peito o tempo todo;

* O bebê parece ter uma relação de amor/ódio com o peito;

* O bebê pode arrotar ou ter gases com freqüência entre as mamadas com tendência a regurgitar com freqüência;

* O bebê pode ter as fezes verdes, moles ou espumosas;

* O peito da mãe está cheio a maior parte do tempo; frequentemente ingurgitado, talvez já teve algumas mastites.

* A mãe pode ter freqüentemente os canais obstruídos, que pode se transformar em mastite.

Se alguns destes comportamentos parece familiar, pode ser que você tenha uma produção abundante de leite, que pode causar um reflexo de ejeção muito forte e/ou desequilíbrio na produção do leite anterior (rico em açúcares) e do leite posterior (rico em gorduras). O comportamento descrito acima pode muitas vezes ser diagnosticado como intolerância à lactose, à proteína de leite, ou até refluxo. Felizmente a produção da maioria das mães superprodutoras se equilibra por volta do terceiro mês de aleitamento, algumas poucas continuam com a hiperprodução além dessa idade, podendo chegar além de 1 ano com hiperlactação se nada é feito. Em qualquer caso, pode ser controlada seguindo algumas medidas simples.

Mas porquê isso acontece? Existem várias razões para que uma mãe produza leite em excesso. Algumas mães produzem muito leite desde o começo. Em alguns outros casos, a abundância é o resultado de maus conselhos. Quando por exemplo:

– A mãe ordenha constantemente

– Usa medicamentos ou homeopatias com o objetivo de aumentar o leite.

– Interrompe a livre demanda. Passando ao segundo peito antes que o bebê tenha terminado o primeiro, dando de mamar por alguns minutos de cada lado do peito para o bebê mamar dos dois peitos a cada mamada. Isto é quando a mãe amamenta controlando duração das mamadas.

– Pega inadequada ou força de sucção diminuída pode desencadear uma compensação de ocitocina que acaba hiper estimulando a ejeção e a produção quando o bebê é novinho. Isto pode acontecer nas situações que o bebê apresenta um freio de língua curto (mesmo que não tão limitante) ou hipotonia na musculatura oral (presente em casos de prematuridade, torcicolo congênito, sindrome de down, entre outros).

– Casos muito raros podem estar associados a distúrbios pituitários onde a taxa de prolactina pode ser muito além do normal. Em geral esses casos já apresentam um histórico de hiperprolactinemia antes mesmo da gestação. É importante que o tratamento seja retomado normalmente com o acompanhamento de endocrinologista.

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O quê fazer para controlar a hiperprodução e o engasgo durante a mamada?

Essas são medidas para ser usadas em conjunto, de forma combinada para garantir a melhora.

  • Pare de usar qualquer medicamento ou homeopatia de efeito galactogogo (que pode aumentar o leite materno).
  • Ofereça o seio aos primeiros sinais de fome, preparando a aréola (deixando ela bem macia com massagem e se for preciso ordenha) e garantindo a pega adequada e teste outras posições como recostada, cavalinho, deitada de lado, sling. Posturas com o dorso mais vertical ajudam diminuir as chances de engasgo. Uma compressa fria de 1-2 min antes de ofertar a mama ao bebê pode ajudar melhorar a sensação de inflamação da mama e facilitar a pega para o bebê.
  • Se o seio está muito cheio, seu filho apresenta problemas com o ganho de peso ou gases,  ordenhe o seio antes das mamadas até ver uma mudança na cor do leite. No começo pode sair num tom transparente meio azulado, e gradativamente vai ficando mais branco, é nesse momento que deve colocar o bebê ao seio. Antecipe as mamadas, não espere o choro para começar a ordenha. Reserve o leite, e ofereça no fim da mamada com copinho ou colher se julgar necessário.
  • Alimente o bebê com um só peito de cada vez. Garanta que ele mame do seio bem flácido. Se ele mamar até soltar o seio, mas em poucos minutos solicitar o peito novamente ofereça o mesmo lado. Lembre que amamentar não é apenas alimentar. Use esses pedidos de função emocional ao seu favor.
  • Lembre que o fator inibitório da lactação  (IFL) se encontra no primeiro leite que sai da mama, uma das medidas de controle do excesso de produção é “block feeding” que consiste justamente em garantir a permanência do IFL na mama. O esgotamento completo deve ser feito preferencialmente ao pela criança, para isso retirar um pouco antes para garantir que o bebê consiga uma mamada tranquila e eficiente é ideal. Após a mamada, retenha a mama cheia o máximo de tempo possível, evitando retirar leite (principalmente aquela mama que ficou parada na mamada).
  • Se sente desconforto pelo peito ingurgitado no intervalo entre mamadas, realize compressa fria curta (1-2 min) e massagem, apenas para aliviar o ingurgitamento e desconforto do seio. Só ordenhe caso sinta muito desconforto, usando preferencialmente a ordenha manual. Nesse caso não ordenhe muito, pois isto arriscaria estimular o peito produzir ainda mais leite.
  • Faça compressas frias de 5 – 15 min várias vezes ao dia (pelo menos 2-4 vezes). Dê preferência aos períodos que mais risco corre de hiperprodução: a madrugada, depois da soneca do almoço, p. e.  Nesses casos, pode fazer compressa fria antes de ir dormir após a criança mamar. Pode usar uma fralda descartável bem molhada com água e deixar na geladeira ou congelador para usar a mesma várias vezes ao dia. O frio causa vasoconstrição, limitando a circulação na área o que vai ajudar diminuir a produção. Mas é importante tomar cuidado com o tempo, não ultrapassar 15 min, já que excesso de frio pode ter o efeito contrário, aumentar a circulação e assim, aumentar ainda mais a produção. Na medida que a produção vai diminuindo pode ir parando com estas compressas.
  • Use a postura de tesoura para sujeitar o mamilo. Usando o indicador e dedo médio segure a ponta do mamilo firmemente. Isto pode ajudar a moderar a força de saída do leite já que essa postura comprime os dutos limitando assim a saída do leite. Use SÓ nos casos que não for possível a ordenha antes de oferecer o seio ao bebê, usando em conjunto com posturas para amamentar onde o dorso do bebê fica mais verticalizado, isto ajudará de forma efetiva evita engasgamentos.
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  • Não utilize conchas sob hipótese alguma, elas podem oferecer alívio temporário para o ingurgitamento, mas em longo prazo pioram a incidência de hiperlactação uma vez atuam pressionando e estimulando constantemente o mamilo. Prefira os absorventes para os seios, mas cuidado para fazer troca regular, pra evitar que fiquem encharcados, atuando como compressa no seio de forma constante.
  • Use um sutiã de bom suporte. Prefira usar um top esportivo de alto impacto aos sutiãs de amamentação comuns. O sutiã de amamentação comum é de um tecido muito mole e facilmente cede ao peso do peito deixando os seios sem suporte adequado, favorecendo uma postura inadequada dos dutos, pressionando os tecidos nas bordas da abertura, e assim pode tornar comuns os ingurgitamentos. Os tops esportivos em geral possuem copas pré formadas ao calor,  e são feitos de materiais respiráveis, alguns até antibactericidas. Para amamentar usando top basta puxar para baixo. Após lavar, deixar ele um tempinho na geladeira ajudará as fibras elásticas se recuperar.

Espero que essas orientações sejam de utilidade. Mas, por favor, no caso de continuar a ter dificuldades com você ou seu bebê, não duvide em procurar ajuda de uma consultora de amamentação. Não pense que será um gasto, será um investimento em qualidade de vida que pode lhe poupar de muitas dores de cabeça.


Referências
Marie Courdent. Mucha leche, muy rápido y muy fuerte. NUEVO COMIENZO, Vol. 16 Número 1, 2004. 

Caderneta 23. SAÚDE DA CRIANÇA: Nutrição Infantil Aleitamento Materno e Alimentação Complementar. Publicação do Ministério da saúde

Caroline GA van Veldhuizen-Staas. Overabundant milk supply: an alternative way to intervene by full drainage and block feeding. International Breastfeeding Journal 2007, 2:11

Anne Eglash . Treatment of Maternal Hypergalactia. Breastfeed Med. 2014;9(9):423–425. doi:10.1089/bfm.2014.0133

Carlos Gonzalez. 2015. Manual Prático de aleitamento materno. Edição português. Editora Timo.

Veja também

Como funciona a produção do leite materno

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Ultima revisão e atualização 26/01/2022

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