A melatonina e o sono

A melatonina está sendo oferecida como a solução mágica para quem tem problemas de insonia, muitos pais e mães estão se iludindo, achando que essa seria a solução de seus problemas de sono noturno. Mas cuidado!  Problemas de sono são muito mais complexos que a simples falta de uma substancia no organismo da criança. 

A melatonina é um hormônio sintetizado pela glândula pineal, está envolvida em funções imunomodulatórias, antiinflamatórias, antitumorais, antioxidantes, e cronobióticas. Sua secreção ocorre à noite, estando relacionada com o sono, redução da temperatura corporal e outros eventos noturnos. Tem sua secreção controlada por sistema endógeno sincronizado com o ambiente externo (luz/dia). Os níveis orgânicos de melatonina são altos quando está escuro, e baixos no claro. A secreção natural de melatonina diminui com a idade e influência o ritmo sazonal e circadiano, sobre o ciclo sono-vigília e sobre a reprodução. Apresenta um padrão de secreção dia-noite, sensível a luminosidade, tendo um pico de produção elevada no início da noite e queda no final.

Koch et al, 2009.

A secreção da melatonina é regulada por uma via neural complexa que começa na retina e nervo ótico, e conecta o núcleo supraquiasmático do hipotálamo à glândula pineal. Sob circunstâncias naturais de um ciclo claro-escuro ocorre uma produção rítmica circadiana de melatonina. A exposição a luminosidade (luz brilhante) é suficiente para suprimir a síntese e degradar os níveis de melatonina presentes no organismo. Evidências clínicas e experimentais mostram que diversos estados biológicos incluindo o humor podem ser influenciados pela melatonina. 

Sua principal função em mamíferos é a de mediar sinais de escuridão, traduzindo informações sobre a duração da noite, com possíveis implicações no controle da ritmicidade circadiana e da sazonabilidade.  A melatonina funciona como indutor do sono e estudos recentes sugerem que ela age mais como um agente que prepara o indivíduo para o sono talvez sinalizando para uma redução da temperatura corporal. Nesse sentido, ela atuaria através de suas propriedades cronobióticas (organização da resposta aos ciclos claro/escuro). Uma metanálise recente mostrou que a melatonina não altera substancialmente as medidas do sono reforçando o conceito anterior.

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A melatonina tem seu uso estabelecido na clínica médica no tratamento de alguns distúrbios do sono como insônia por fase retardada, ciclo vigília-sono com períodos diferentes de 24h, latência prolongada para o sono, fragmentação do sono, distúrbios comportamentais do sono REM, correções do sono do idoso, dessincronização entre o ciclo vigília-sono e o dia e a noite, como observado com frequência em alguns tipos de cegueira (pré-quiasmáticas). Além disso, por ser um importante agente regulador do ciclo vigília-sono e também como um agente antioxidante, antiamiloidogênico, neurotrófico e neuroplástico, é usado como um coadjuvante terapêutico em doenças neurológicas e degenerativas (como doenças do espectro do autismo, síndrome de déficit de atenção e hiperatividade, Smith- Magenis, etc) que resultam em distúrbios do sono e dos ritmos biológicos circadianos. Particularmente, em relação a esses últimos, a melatonina é vista como um poderoso cronobiótico, isto é, um agente capaz de sincronizar o ciclo circadiano de muitas funções do organismo. Por isso tem, também, sido usada na correção dos distúrbios causados pelo “jet-lag” (mudança de fuso horário) .  

Estudos mostram que a melatonina é uma substância de distribuição geral no organismo e de efeitos órgão e espécie específicos. Portanto, apesar de muito ter-se propagado sobre a sua utilidade terapêutica, deve-se considerar que suas propriedades e aplicações devem ser tomadas com cautela, já que seu mecanismo exato de ação ainda é desconhecido, e as consequências de seu uso em longo prazo são incertas.  Vale a pena afirmar que existem diversas condições associadas ao sono em que a melatonina apresenta um benefício terapêutico largamente comprovado. Na Europa e nos Estados Unidos, a melatonina ainda é tratada como um suplemento alimentar e as preparações terapêuticas não passam pelo controle de qualidade a que os medicamentos estão sujeitos.

No Brasil o medicamento tem o seu uso proibido, não tendo nenhum registro sanitário vigente na ANVISA, apesar de tratar-se de uma substância com baixa toxicidade, o mesmo não se pode dizer de vários agentes que são liberados para uso terapêutico como indutores do sono.  

Gostaria deixar um Alerta especial sobre o uso da Melatonina sintética nos problemas de sono . A comercialização e uso da melatonina  através de diversos sites, seu fácil acesso através de internet, sem a necessidade de prescrição médica e a falta de regulação pela anvisa,  tem deixado em alerta os especialistas que tratam distúrbios de sono.

A melatonina é uma substância naturalmente produzida pelo organismo, mas não é única envolvida no controle dos ciclos de sono/vigilia. Seu uso deve ser acompanhado por profissionais, para uma higiene de sono adequada e tratamento correto dos distúrbios de sono, em qualquer idade.  

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Texto de Zioneth Garcia

Referências

Sousa Neto JA, Castro BF. Melatonin, biological rhythms and sleep – a review of the literature. Rev Bras Neurol. 49(2):57-71, 2013. Disponível aqui

Alóe F et al. Sleep-wake cycle mechanisms. Rev Bras Psiquiatr. 2005;27(Supl I):33-9. Disponível aqui

Koch, B.C.P., Nagtegaal, J.E., Kerkhof, G.A., & ter Wee, P.M. (2009). Circadian sleep-wake rhythm disturbances in end-stage renal disease. Nature Reviews Nephrology, 5, 407-416.

POSICIONAMENTO DA SBEM SOBRE A MELATONINA. Disponível aqui

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