Ser mãe longe do lar onde crescemos, significa estar longe de nossas referências e maternas e culturais de infância. Pode ser em outro estado, ou mesmo outro pais. Sentimos saudades do tempero regional, das festas tradicionais, ao tempo que aprendemos viver tradições culturais que nos são estranhas. A maternidade expatriada é uma situação que vivo na pele. Aqui estou eu, uma Colombiana, criando filhos brasileiros no Sul do Brasil. Misturando duas culturas, que acabará dando a eles uma identidade cultural bem diferente da minha.
Tenho acompanhado cada vez mais mães sozinhas, longe do seu lar de criação, as razões podem ser diferentes, mas o desafio é igual. Todas, tendo que enfrentar o desafio de criar seus filhos sem mais rede de apoio que o pai, ou com uma rede de apoio itinerante, que vem uma vez ao ano ou uma vez no semestre, fica por algumas semanas e vai embora.
Nos primeiros dias de vida do bebê o mais difícil é aceitar a pouca ajuda com a que se pode contar, lutar com a cultura de amamentação local. Principalmente para quem está fora do Brasil, pode ser bem complicado encontrar ajuda para as dificuldades com a lactância que precisam acompanhamento profissional. Não são poucas, as brasileiras que vi entregar a luta para amamentar apenas por falta de apoio profissional, se sentindo incompreendidas e abandonadas, por quase ninguém entender sua tristeza ao perder a amamentação.

A forma como se enxerga a infância e o papel dos pais na criação, muda muito conforme a região e o pais no qual se viva. Uma mãe de dois, que mora em USA, me contava que tinha saudades dos restaurantes de Brasil, por uma coisa simples: restaurantes com área kids, ou que davam canetinhas e folhas de colorir para as crianças se distrair, algo tão comum no Brasil, mas difícil de achar em vários países na Europa e América do Norte.
Mães que moram no Reino Unido, Austrália sempre me comentam, em tom de desabafo sobre a altíssima pressão por resultados no desenvolvimento dos bebês, o ganho de peso e alcançar os marcos de desenvolvimento conforme a curva, é cobrado a cada visita ao serviço de saúde, porém, a queixa em geral é o baixo suporte em questões básicas de amamentação, sono ou estimulação, em situações mais complexas então, a solução quase sempre é uma só, entra com formula, na mamadeira. Em países com baixa taxa de natalidade, cada bebê é um tesouro, e os profissionais são induzidos a soluções eficientes e rápidas, o que nem sempre é possível.
Uma mãe que mora na Alemanha, me contava como estava sendo complicado lidar com os problemas de sono de seu filho, uma vez que a pressão de todos, desde profissionais da saúde até o pai e seus familiares era para deixar chorar e deixar no berço, desmamar e passar a dar apenas mamadeira. Qualquer solução fora desse esquema, ela teria que encarar sozinha.
Uma mãe no Japão, tinha muita dificuldade para o desmame noturno de sua filha de 2 anos e meio, isso porque toda vez que ela tentava regular as mamadas noturnas a criança falava ou chorava e os vizinhos reclamavam, e tinha levado algumas multas pelo barulho, o silencio é lei! Ela acabou por programar o fim do processo de desmame noturno para as festas de fim de ano, um período no qual seus vizinhos não estariam em casa para reclamar.
Essa pressão cultural para realizar escolhas, que talvez não seriam a primeira opção, pesa muito na hora de criar nossos filhos fora de nossa pátria. A maternidade no Brasil, e arrisco dizer que em latinoamérica, é muito acolhedora. Mães latinas fazemos de tudo para que nossos filhos tenham o mínimo de choro possível, o choro nos incomoda, é um sinal que algo não anda bem com aquela criança, para nos é normal alguém perguntar se está tudo bem. Mas essa não é a realidade que se enfrenta fora de latinoamérica, e quem está fora escuta julgamentos e se vê sozinha nadando contra uma corrente cultural diferente à que tem como referência.

A educação alimentar, é talvez uma das questões que pegou por aqui. O tempero carregado no sal e o doce do Brasil ainda me custa aceitar, em contra partida as mistura agridoce, doce/salgado, misturas de carnes, e temperos mais aromáticos (comino, pimenta, paprica), tão presentes na minha cultura, são um desafio para os meus filhos, e meu marido. Ele não curte mesmo essas misturas. O fato é que, é difícil introduzir no dia dia alimentos de nossa região de origem, já que os ingredientes muitas vezes estão pouco disponíveis. Como ensinar uma criança curtir a feijoada se mal dá para achar o feijão certo, que se dirá todo o resto de ingrediente no meio de USA. Para mim, como cultivar o gosto por uns tamales* no São Juan, se não consigo achar nem as folhas de bananeiras certas para fazer.
Uma situação que me lembro até hoje, foi com minha primeira filha , ela tinha 4 anos, estávamos na Colômbia, e ela pediu feijão de almoço, meu pai fez um feijão caprichado, ao estilo Colombiano, uma delicia, para mim, por que ela experimentou e não comeu, ela diz claramente, esse não é feijão. A sua unica referência era o feijão do jeitinho brasileiro, e o que recebeu estava longe da sua referência.

A saudades de casa bate especialmente nas datas especiais, páscoa, Halloween, Natal e ano novo. Uma mistura entre a saudades de casa, das tradições com as que cresci, e de não poder ter a oportunidade de mostrar essas tradições aos meus filhos, do jeito como eu as vivi. É tão diferente a tradição, que chego me sentir sozinha. No 31 de outubro, tenho saudades do que não vivi com meus filhos, sair pelas ruas de fantasia para pedir doces, cantando “triqui triqui Halloween”, por mais que tenha um apelo comercial no Brasil, não chega aos pés do que essa festa representa fora. No natal por exemplo, mesmo que prepare meus pratos tradicionais, ninguém os come pois não fazem parte do acervo de comidas natalinas do Brasil, optei por fazer em casa só para nós
Em contra partida, tenho aprendido viver e curtir as novas tradições, regionais, conheci as festas no interior de São Paulo, agora no Sul, adoro uma festa junina/ julina/ quermese. Adoramos milho nas mil e uma preparações, aprendi fazer sagu ao vinho, sobremesa favorita de Antonio. Ainda tento, pelo menos na intimidade do nosso lar, manter viva a chama da cultura Colombiana.
Vamos criando nossas próprias tradições familiares, misturando de lá e daqui, talvez não sejam as tradições que nossos filhos passaram para frente, mas pelo menos tem mais um pouquinho de mundo nas suas vidas.
Um abraço para você que é mãe longe de sua cultura. Não está sozinha, pode contar comigo.
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Texto original de Zioneth Garcia