A comunicação, essa troca de mensagens acontece antes mesmo da verbalização. Desde bem novinhas, as crianças estão constantemente se comunicando, e de diversas formas: o choro, as caretas, os sons, os gritinhos, os olhares, os gestos, suas atitudes, as sílabas, as palavras, as frases. Conforme crescem, a linguagem que usam evolui, a forma como a comunicação acontece vai mudando, e precisamos estar atentos e dispostos a ouvir cada uma dessas linguagens, com o corpo todo, respondendo na mesma medida, para tornar a comunicação cada vez mais eficiente.
Conhecer nosso interlocutor é essencial para estabelecer uma comunicação eficiente. O seu interlocutor é seu filho ou filha: em qual fase de desenvolvimento se encontra? Qual linguagem usa? Ele fala, grunhe, chora, grita, balbucia, faz caretas, vira as costas quando não se interessa, lhe ignora quando não quer fazer uma atividade? Você presta atenção aos diferentes tipos de linguagem? E qual linguagem você usa com ele? Você fala, muda o tom de voz nas diferentes situações? A sua casa está adaptada para as necessidades da criança? O quê os espaços dizem para sua criança? Você se vê constantemente lhe reprendendo por pegar algo que não pode?
A comunicação acontece em vários níveis, não apenas o verbal, o seu tom de voz, a expressão facial, postura corporal e o ambiente estão constantemente transmitindo mensagens para sua criança, e do mesmo modo a criança está transmitindo para nós. Conhecendo a fase de desenvolvimento de seu filho você poderá avaliar se os comportamentos que esperam da criança estão acordes à sua idade, e ajustar as diversas formas de comunicação.
Os comportamentos das criança são resposta aos comportamentos que os adultos manifestam com elas, sua necessidade constante é obter atenção, dessa forma garante a satisfação de suas necessidades fisiológicas e emocionais. A criança não diferencia se a atenção é positiva ou negativa, ela quer apenas uma coisa: atenção. Vou me explicar através de exemplos, de situações normais, que foram trazidas através das consultas.
O primeiro exemplo é João. Ele tem 7 meses, na hora de trocar a fralda ele quer pegar todo ao seu redor especialmente as coisas atrás dele, o que leva cada troca de fralda a uma luta corporal. Conversar e avisar que irá trocar fralda, ir narrando o que está acontecendo não tem ajudado muito. Sugeri tirar tudo do trocador, deixar apenas o essencial, a fralda, os lencinhos e a pomada, envolvendo ele na troca, pedindo para segurar os lencinhos ou mesmo com algum brinquedo enquanto troca a fralda. Nas primeiras tentativas ele ainda procurava se tinha algo atrás dele, mas quando percebeu que não tinha nada de especial, a mãe foi sentindo maior facilidade para lhe capturar a atenção e terminar a troca sem luta.
Não podemos esperar que bebês de 7 meses tenham autocontrole, a conversa ajuda acalmar, preparando para o que vai acontecer, porém, nessa fase, o impulso é pela exploração do ambiente domina seu ser, os objetos ao seu alcance são um convite para exploração. Assim, se não é adequado para o bebê, deve sair do alcance das suas mãos.

O segundo exemplo é Luiza que tem 3 meses, dormia muito bem, acordando para mamar 1 vez a noite, aprendeu dar gritinhos recentemente, com o que passou ficar acordada até 2 horas seguidas durante a madrugada, após a mamada habitual, com isso começaram as tentativas para fazer dormir mais rápido, primeiro trazendo para o meio dos pais, mas os pais se rendiam às brincadeiras e conversas, depois tentaram embalar no colo por vários minutos trocando do colo do pai para a mãe várias vezes, por último passaram alternar as madrugadas em claro e um dos pais ficava com ela na sala (de luzes ligadas) para o outro descansar no quarto. Uma fase que o esperado seria durar 2-3 dias, já levava mais de 3 semanas. A atenção que recebia de madrugada acabou enviando uma mensagem para a bebê: de madrugada é hora de brincar. Com o comportamento dos pais mostraram que as brincadeiras nesse horário eram aceitáveis, o que acabou fixando um padrão que devia ser apenas temporário.
A sugestão foi começar mudar a atitude de noite, comunicar com o ambiente que era hora de descansar, deixando tudo escuro, apenas com uma luz tênue para quebrar a penumbra total e enxergar a criança, oferecer a mamada em silêncio, sem sair da habitação, e mantendo apenas comunicação não verbal usando os tapinhas no bumbum que a mãe sempre usava nas sonecas para lhe ajudar adormecer durante a mamada, e caso não dormisse após a mamada, deixar confortável no seu espaço de dormir ao lado da cama do casal, deixar conversar mas sem se preocupar por fazer dormir imediatamente, apenas deitar do lado e descansar, deixar falando sozinha a noite. Quando ela começava dar sinais de cansaço, resmungar ou tentar chorar, então ai sim pegar no colo ou levar ao seio e embalar o sono. Ao mesmo tempo, houve aumento das conversa durante o dia, nos períodos acordada, para satisfazer essa necessidade crescente de interação. Não foi um processo fácil, ao final os pais não conseguiam dormir com o concerto de gritinhos toda madrugada, mas após alguns dias o tempo dessa atividade noturna começou diminuir, e após umas duas semanas não acontecia mais, voltaram ao padrão mamar e dormir de antes.

O terceiro exemplo é o de Helena, que tem 18 meses, a sua mãe quer controlar a demanda diurna, porém, tem muita dificuldade já que Helena praticamente se serve sozinha do seio. Se queixa que Helena não consegue brincar mais que 10 minutos sozinha e começa lhe solicitar, apesar de contar com uma sala cheia de brinquedos, o que a tem levado usar a TV como forma de distrair para conseguir fazer tarefas de casa, mas isso a deixa muito desconfortável. Na conversa com a mãe ficou evidente que o seio era a ferramenta principal para acalmar o choro ou mesmo fazer a criança ficar quietinha uns minutos, a roupa usada pela mãe era bem decotada, dando acesso fácil e rápido ao seio. No meio da conversa Helena se aproximou da mãe puxou um pouquinho a blusa e começou mamar, para conseguir finalizar a conversar comigo a mãe teve a criança no seio mais de 30 minutos, trocando de seio várias vezes, mesmo com o pai tentando chamar para brincar, ela sai e voltava em poucos minutos. Ficou evidente que Helena usava a mamada como forma de comunicação, para solicitar a atenção materna, então foi necessário começar entender quais mensagens ela passava a cada pedido. Qual necessidade precisava ser satisfeita? Essas necessidades só poderiam ser satisfeitas no seio? que outras ferramentas ou estratégias poderiam ser usadas para atender esses pedidos?

Uma criança de 18 meses ainda não se comunica claramente, então não vai dizer que quer brincar, ou quer comer, ela vai usar as linguagens que conhece: choro e pedido de mamada, no caso de Helena a segunda era a opção melhor sucedida. Entre outras mudanças, se sugeriu uma nova abordagem para a comunicação, usando vários níveis: comunicação verbal, não verbal e o ambiente . Começamos por uma conversa sincera inicial (comunicação verbal), mostrando para a criança o desconforto sobre os ataques diurnos ao seio, combinando uma nova forma de pedir a mamada, reforçando com escolha de roupas que cubram mais o corpo, evitando o acesso fácil (comunicação não verbal) e antecipando as necessidades fisiológicas com uma rotina comunicada de forma visual. A repetição dessas conversa e combinados foi essencial devido à fase de desenvolvimento.
Alinhar as expectativas também foi importante, não podemos exigir que uma criança de 18 meses fique concentrada numa mesma atividade por mais de 10-15 minutos, o seu cérebro ainda não tem essa capacidade desenvolvida, e a tendência é cansar do brinquedo, se tem todos os brinquedos disponíveis ao mesmo tempo, vai cansar de todos ao mesmo tempo. Se propôs a organização dos espaços, tanto da sua sala de brinquedo, fazendo um rodízio para prender a atenção e potencializar o uso de um ou dois brinquedos de cada vez. Ao mesmo tempo, para a criança se sentir próxima de sua mãe, a sugestão foi criar um cantinho em cada ambiente da casa, para que pudesse brincar e conversar com sua mãe, recebendo pequenas tarefas ou novas provocações cada que se percebia a perda de interesse na atividade, trocando o brinquedo ou mesmo dando algo do ambiente para enriquecer a brincadeira, assim ela tinha uma cozinha de brinquedo na cozinha, ajudava com as roupas na lavanderia, e até mostrou grande prazer ao ser solicitada de passar pano para limpar pó na sala, etc.
A mudança mais significativa, foi a atitude materna, não só trazendo conversas para orientar constantemente, mas com suas ações, ao avaliar cada pedido de mamada como uma mensagem, trazendo uma nova perspectiva sobre a amamentação, permitindo que a relação mãe filha evoluísse ao ponto de conseguir oferecer alternativas para satisfazer exatamente a necessidades por trás de cada pedido. O desafio foi grande para a família, mas após algumas semanas, conseguiram reduzir as mamadas até 3-4 por dia.
Nesses três exemplos mostrei como nossas atitudes, nossas ações, a forma como organizamos o espaço e como esperamos que a criança se relacione com o ambiente, são elementos da comunicação com as crianças tão importantes quanto as palavras, o tom de voz e a nossa expressão facial. Precisamos sincronizar nossos desejos, com nossos pedidos e nossas ações, dessa forma fica mais fácil para a criança entender a mensagem que queremos transmitir, já que a receberá em vários níveis.
Deixo um convite para avaliar a comunicação que está mantendo com seus filhos pequenos, a atenção às muitas linguagens que usam e escutam.
*os casos são reais, os nomes foram trocados.
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Texto original de Zioneth Garcia