O caso que quero compartilhar hoje é um exemplo de como é importante manter a comunicação constante com as crianças. Ao nos permitir sentir na frente delas, lhes concedemos o aval que precisam para sentir.
A família tinha mudado recentemente de cidade, coisa de três semanas, ainda estavam no processo de adequar a casa e a rotina. A filha de um pouco mais de dois anos e meio, estava desfraldada, frequentava escolinha e tinha seus avós por perto na antiga cidade. Na nova cidade, após duas semanas que tudo parecia estar normal, veio a regressão no desfralde, começando fazer xixi e cocô na roupa de novo e as crises de choro frequentes. Foi então que a mãe me procurou.
Foi fácil criar empatia pela situação, também passei por mudanças de cidade com crianças pequenas e sei como é difícil. Na nossa conversa, ficou claro que a criança tinha muita liberdade e uma vida social muito ativa na antiga cidade, o que teria mudado drásticamente na nova casa. Os avós que estavam sempre presentes, agora eram uma ligação no skype algumas vezes na semana. As saídas ao parque, encontrar amiguinhos agora eram solitárias e entediantes, não tinha mais o horário de escolinha que organizava seu dia, a casa nova ainda era estranha para ela, ainda pedia para voltar para sua casa (a antiga). O que foi empolgante, encarado como férias durante os primeiros 15 dias, começou se mostrar como a realidade definitiva, não voltaria mas para a casa velha.
A mãe, estava triste, com saudades da antiga cidade, suas amizades e sua família, mas não falava para ninguém, a mudança para ficar próxima do seu parceiro e pai da criança tinha sido planejada e esperada por vários meses. Muito ansiosa pela regressão no controle de esfíncteres e com a falta de rotina após a mudança, e ainda uma casa cheia de caixas para organizar, estava sob muito estresse, chegando ao limite da tolerância no trato com a criança. E então, bem no meio da consulta, após muitos “mãe, mãe, mãe, mãe”, tivemos que fazer uma pausa, a criança fez cocô sobre a cama da mãe, o que era obviamente uma tentativa de chamar sua atenção. Foi o momento chave. Depois disso descobri que esse comportamento era comum, a criança fazia m qualquer lugar mesmo quando a mãe lhe advertia ou oferecia o banheiro, era sua forma de chamar atenção, até mesmo nos momentos nos que mãe e pai conversavam.
Era preciso aliviar o estresse, permitir a criança sentir e ser acolhida, ajudar a firmar o processo de apropriação do novo espaço, para que se sentisse segura novamente em ir ao banheiro sozinha, como antes.
A primeira sugestão foi ter uma conversa sincera, expressando para a criança a saudades do antigo lar, dos amigos, dos parentes. Se permitir chorar e sentir junto da criança, para ela ver que seus sentimentos não estavam sozinhos. Trabalhar os sentimentos de saudade e medo através de várias ferramentas lúdicas: historinhas, brincadeiras de faz de conta, desenhos animados escolhidos a dedo.
A seguir precisávamos ajudar a criança se apropriar do novo espaço, apesar de estarem ali fazia duas semanas, sugeri para a mãe fazer um tour pela casa toda, mostrando e discutindo com a criança a vocação de cada um dos espaços. Focando principalmente no banheiro, tornando este especialmente acolhedor, escolhendo com ajuda da criança adesivos, saboneteira, banquinho, e outros acessórios para lhe facilitar o acesso sem precisar da mediação de adultos. Brincadeiras como esconde- esconde, ajudar na organização de espaços, definindo local das decorações, ajudaram reforçar ainda mais o senso de apropriação do novo lar.
Nossa abordagem sugeriu estabelecer uma nova rotina, melhorar a comunicação e oferecer atenção positiva. Uma rotina desenhada foi a estratégia sugerida, acompanhada de repetição constante, roupas fáceis de tirar e pôr, atenção ao ritmo metabólico para convidar ao banheiro na hora certa e tempo de brincar com a mamãe e o papai. A repetição, a conversa constante e a inclusão nas atividades cotidianas da casa foram essenciais.
Após uns poucos dias de rotina recebi o retorno, a criança tinha aprendido a palavra saudades, falava várias vezes ao dia com os avós, mandando bom dia, contando que tinha feito xixi no vaso e dando boa noite. O xixi e o cocô tinha voltado ao normal, no vaso, como ela fazia antes, agora sem nem chamar a mãe, ela queria ir e fazer todo sozinha. As crises de choro tinham diminuído consideravelmente, e quando apareciam eram facilmente controláveis.
A família estava procurando junto uma nova escolinha, e a mãe se preparava para trabalhar. Os avós fariam uma visita em breve, e as coisas estavam finalmente se encaixando no lugar certo. Fiquei muito feliz, as soluções propostas foram relativamente simples mas o trabalho constante e disciplina dos pais permitiu que mostrassem resultados rápidamente.
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Texto original de Zioneth Garcia